Por Elvio César Bezerra, advogado.
EM BRIGA DE MARIDO E
MULHER SE METE A COLHER, SIM!
MARÇO, MÊS DA MULHER
A lei tem que
acompanhar o dinamismo e a evolução da sociedade. Por isso, no que tange os
avanços das políticas públicas para as mulheres, cabe refletir sobre o famoso
ditado popular: “Em briga de marido e
mulher ninguém mete a colher.” Assim, de acordo com a Corte Superior do
nosso país, quando se trata de violência doméstica e intrafamiliar contra a
mulher, praticamente a frase deve ser encarada da seguinte forma: EM BRIGA DE
MARIDO E MULHER SE METE A COLHER, SIM!
Na data de 09 de
fevereiro de 2012, o Supremo Tribunal Federal julgou procedente a Ação de
Inconstitucionalidade (ADI 4424) ajuizada pela Procuradoria Geral da República,
quanto aos artigos 12, inciso I; 16; e 41 da Lei Maria da Penha (Lei
11.340/2006), ou seja, o Supremo Tribunal Federal decidiu que aos crimes da Lei
Maria da Penha e nos crimes de lesão corporal praticados contra a mulher no
ambiente doméstico, mesmo de caráter leve, atua-se mediante ação penal pública
incondicionada, ou seja, significa que o Ministério Público pode denunciar o agressor,
mesmo que a vítima não apresente queixa contra quem a agrediu. Com a decisão da
Suprema Corte, o Estado tem que intervir para garantir a proteção da mulher,
independente de representação da mesma.
Na mesma data o Supremo
Tribunal também declarou procedente a Ação Declaratória de Constitucionalidade
(ADC) 19, ajuizada pela Presidência da República. Por votação unânime, o
Plenário do STF declarou a constitucionalidade dos artigos 1º, 33 e 41 da
Lei 11.340/2006 (Lei Maria da Penha). A lei Maria da Penha cria mecanismos para
coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher, sendo hoje um dos
principais avanços dentro das Políticas Públicas para as mulheres.
Com a decisão, a
Suprema Corte Brasileira reconheceu que a violência contra a mulher não é um
fato novo, pelo contrário é antigo. Nesse sentido, a publicação do “Mapa da Violência 2015 – Homicídios de
Mulheres no Brasil” registra que a violência contra a mulher “é tão antigo quanto a humanidade. O que é
novo, e muito recente, é a preocupação com a superação dessa violência como
condição necessária para a construção de nossa humanidade. E mais novo ainda é
a judicialização do problema, entendendo a judicialização como a criminalização
da violência contra as mulheres, não só pela letra das normas ou leis, mas
também, e fundamentalmente, pela consolidação de estruturas específicas,
mediante as quais o aparelho policial e/ou jurídico pode ser mobilizado para
proteger as vítimas e/ou punir os agressores.”
O posicionamento do
Supremo Tribunal novamente afirma que a Lei Maria da Penha é um poderoso
instrumento jurídico na luta pela igualação dos direitos das mulheres, até
porque a Lei nasceu da indignação diante da violência cometida contra uma
mulher.
É interessante
ressaltar que o artigo 8º da referida Lei dispõe que a Política Pública que
visa coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher far-se-á por meio
de um conjunto articulado de ações da União, dos Estados, do Distrito Federal e
dos Município e de ações não governamentais. Referido artigo demonstra a
necessidade de realizar o trabalho mediante “Rede de Atendimento e Proteção
Integral à mulher”. Ainda, a Política tem por diretrizes a integração do Poder
Judiciário, do Ministério Público e da Defensoria Pública com as demais
políticas de atendimento (saúde, segurança pública, assistência social,
educação, trabalho e habitação), assim como promoção de estudos e pesquisas,
celebração de convênios, capacitação permanente das Polícias Civil, Militar,
Guarda Municipal, Corpo de Bombeiros; implementação de atendimento policial
especializado para mulheres, em particular nas Delegacias de Atendimento à
Mulher, dentre outras diretrizes. Verifica-se que o intuito é proporcionar a
mulher o acesso, acolhimento e proteção necessária para interromper o ciclo de
violência.
O Supremo Tribunal
Federal também ressaltou que a mulher é vulnerável quando se trata de
constrangimentos físicos, morais e psicológicos sofridos no âmbito privado.
Sabiamente, o ministro Marco Aurélio, em seu voto destacou: “Não há dúvida sobre o histórico de discriminação por ela enfrentado
na esfera afetiva. As agressões sofridas são significativamente maiores do que
as que acontecem – se é que acontecem – contra homens em situação similar.”
Na ocasião do
julgamento, a Ministra Cármen Lúcia, segunda mulher nomeada ao cargo de
ministra do Supremo Tribunal Federal, pediu licença aos demais ministros para
pontuar acerca da mudança de mentalidade e ressaltar sobre as dificuldades
históricas que a mulher enfrenta em decorrência do preconceito e machismo.
Também, frisou que em decorrência da mudança em que passa a sociedade, no que
se refere aos direitos das mulheres: “a
interpretação que agora se oferece para conformar a norma à CF/88 me parece
basear-se exatamente na proteção maior à mulher e na possibilidade, portanto,
de se dar cobro à efetividade da obrigação do Estado de coibir qualquer
violência doméstica”. A ministra também destacou que no que se refere as
frases “em briga de marido e mulher, não
se mete a colher” e “o que se passa na cama é segredo de quem ama”, ela
afirmou que é dever do Estado adentrar ao recinto das “quatro paredes” quando
na relação conjugal que se desenrola ali houver violência. No momento de seu
voto, a Ministra enfatizou: “Eu cresci ouvindo frases, que eram frases de efeito, que
eram frases de brincadeiras, que eram frases muitas vezes ditas num tom jocoso,
que é uma das formas de desmoralizar os direitos”.
Com a
decisão do STF, resta demonstrado que “Em briga de marido e mulher se mete a
colher, sim!”
e que o Estado deve intervir obrigatoriamente nos casos de violência doméstica e
intrafamiliar contra a mulher, até porque em decorrência da vulnerabilidade em
que a mulher se encontra, muitas vezes a mesma não consegue alcançar e pleitear
os direitos que hoje lhe são garantidos.
Portanto, a lei Maria da Penha vigora desde 2006 como principal
instrumento de enfrentamento à violência doméstica e familiar contra a mulher; em 2012 o STF reconheceu que o Estado deve
intervir nas situações de violência doméstica, independente de representação da
vítima, até porque a Corte Superior decidiu que a invisibilidade e o silêncio da
vítima de hostilidades ocorridas na privacidade do lar demonstra a necessidade
do movimento legislativo claro no sentido de assegurar às mulheres agredidas o
acesso efetivo a reparação, a proteção e a justiça.
Nenhum comentário:
Postar um comentário